Hoje, 101 mil servidores que poderiam estar em casa continuam trabalhando. Economia anual com a permanência é de R$ 11,9 bilhões. Especialistas criticam.
O número de servidores públicos do Executivo Federal que recebem abono permanência é recorde. Atualmente, mais de 101 mil pessoas têm direito ao benefício, concedido aos funcionários ativos em condições de se aposentar, mas continuam trabalhando. Diante do desafio de equilibrar as contas públicas e manter mão de obra qualificada e experiente para gerir a máquina, a medida é também uma estratégia do governo para economizar e garantir o ajuste fiscal.
Entre janeiro a maio deste ano, o governo federal gastou, em média, R$ 94,4 milhões por mês com o abono de permanência. Isso leva à estimativa de que, em 2015, o desembolso — incluindo o 13º salário — seja de R$ 1,2 bilhão, caso a quantidade de servidores beneficiados mantenha-se inalterada. Para Roberto Piscitelli, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), a tática é financeiramente vantajosa para a administração pública.
Troca vantajosa
Apesar de o governo perder em receita, uma vez que o benefício é um reembolso da contribuição previdenciária, o gasto do erário é inferior ao que seria desembolsado com novas contratações. “Sai muito mais barato para o Estado pagar o abono. Quando um servidor se aposenta, ele passa a receber os recursos do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). Se optasse por recompor o quadro, o governo teria despesas com a aposentadoria de uma pessoa e com o pagamento das remunerações do novo funcionário”, explica.
Segundo cálculos do governo de julho de 2014, o custo médio anual com cada servidor do Executivo Federal era de R$ 129.467 mil. Caso a pasta comandada pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, cogitasse para este ano a total substituição dos 101.804 funcionários públicos que recebem o abono, o governo teria um gasto de R$ 13,1 bilhões apenas com a reposição do quadro de pessoal. Ao considerar o R$ 1,2 bilhão que devem ser gastos em 2015, a economia líquida seria de R$ 11,9 bilhões, o equivalente a 21,5% da meta estipulada para o superavit primário.
A curto prazo, manter o contingente de servidores em abono permanência pode ser benéfico para o equilíbrio das contas do governo. No entanto, a medida deve prejudicar a oxigenação da máquina pública. De acordo com Piscitelli, as despesas com pessoal estão em torno de 30% da receita corrente líquida, valores abaixo do percentual máximo de 50%, previsto pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).“Com o avanço demográfico da população, que vive mais anos, diria que, hoje, há uma tendência clara que essa proporção se acentue à medida que os governos ficam represando a realização de concursos e nomeação de concursados. Teremos uma máquina pública envelhecida, com buracos nas carreiras”, critica o economista.
Em um contexto de inflação alta e crédito caro, é natural que os servidores protelem a permanência na administração pública para manter o padrão de vida, analisa José Matias-Pereira, professor da UnB. No entanto, para ele, não são apenas os servidores que ganham com isso. “Para a gestão da máquina, isso é ótimo. É uma forma de o Estado receber um pouco mais da colaboração desses trabalhadores, que têm muitos anos de experiência e são altamente qualificados”, disse.
No entanto, para o especialista, não há um processo de renovação ordenada. “Muitos concursos saem por decisões pouco consistentes e muito mais por pressão eventual de dirigentes de determinadas áreas. Muitas vezes, quando a administração já está entrando em um processo de semiparalisia. O que temos é um governo postergando decisões e estimulando as pessoas a permanecerem em atividade por mais tempo”, reclamou Matias.
A falta de uma posição mais estratégica do governo no equilíbrio do número de trabalhadores qualificados com o ingresso de novos servidores vai agravar a situação do mercado de trabalho, prevê Carlos Alberto Ramos, também professor de economia da UnB. “O setor público foi responsável por empregar grande parcela da atual juventude, que estava saindo das universidades com ensino superior. Com o mercado de trabalho privado também em crise, não vai ter setor algum puxando essa gente”, analisou.
Cargo mantido
O número de servidores em condições de se aposentar, mas que continuam no trabalho, aumentou quase 5 pontos percentuais em seis anos
O que é o abono de permanência
Benefício concedido ao servidor que já está em idade de se aposentar, mas é mantido na função por ser considerado estratégico, já que detém muito conhecimento da máquina pública
Quem tem direito
Todos os servidores ativos que contribuem para o regime público de previdência social (RPPS) e que reúnam, no mínimo, uma das condições constitucionais de aposentadoria voluntária
Mulher
» 48 anos de idade + 30 anos de contribuição + 5 anos no cargo, além de período adicional de contribuição equivalente a 20% do tempo que, em 16 de dezembro de 1998, faltaria para atingir os 30 anos de contribuição
» 55 anos de idade + 30 anos de contribuição + 10 anos de serviço público + 5 anos no cargo
» 60 anos de idade + 25 anos de contribuição + 10 anos de serviço público + 5 anos no cargo
Homem
» 53 anos de idade + 35 anos de contribuição + 5 anos no cargo, além de período adicional de contribuição equivalente a 20% do tempo que em 16 de dezembro de 1998 faltaria para atingir os 35 anos de contribuição
» 60 anos de idade + 35 anos de contribuição + 10 anos de serviço público + 5 anos no cargo
» 65 anos de idade + 30 anos de contribuição + 10 anos de serviço público + 5 anos no cargo
Como ter direito?
Os interessados devem optar, via requerimento, por permanecer em atividade
Por quanto tempo podem receber?
Pelo tempo que quiserem até aos 70 anos, quando serão aposentados compulsoriamente
Qual é o valor?
Equivale, exatamente, ao valor da contribuição previdenciária de 11% sobre o salário, descontada do servidor, mensalmente. Esse percentual é reembolsado | Fonte: Correio Braziliense e Ministério do Planejamento.